João Paulo II escreveu na Reconciliatio Paenitentia (n. 18) que o homem contemporâneo vive «sob a ameaça de um eclipse da consciência, de uma deformação da consciência, de um entorpecimento ou de uma anestesia da consciência»
A causa se deve buscar na perda do sentido de Deus, ou seja «a progressiva ofuscação da capacidade de perceber a presença vivificante e salvadora de Deus». Perdido o sentido de Deus, a sensibilidade ante a ofensa a Deus se amortiza e perde sentido.
«Quando se perde o sentido de Deus, diz o Papa, também o sentido do homem fica ameaçado e contaminado... A criatura sem o Criador desaparece... Mais ainda, pelo esquecimento de Deus, a própria criatura fica obscurecida». E mais adiante: «Uma vez excluída a referência de Deus, não surpreende que o sentido de todas as coisas resulte profundamento deformado... Em realidade, vivendo, “como se Deus não existisse”, o homem perde não somente o mistério de Deus, senão também o do mundo e o de seu próprio ser».
Explica o Papa: «O eclipse do sentido de Deus e do homem conduz inevitavelmente ao materialismo prático, no qual proliferam o individualismo, o utilitarismo e o hedonismo... A sexualidade se despersonaliza e instrumentaliza... A procriação se converte no inimigo a evitar na prática da sexualidade. As relações interpessoais experimentam um grave empobrecimento. Os primeiros que sofrem suas consequências negativas são a mulher, a criança, o enfermo ou o que sofre e o ancião. É a supremacia do mais forte sobre o mais fraco». Por isso o Papa advertiu seriamente contra esta tendência: «O homem pode construir um mundo sem Deus, porém este mundo acabará por voltar-se contra o próprio homem».
Esta perda do sentido do pecado engendra o que hoje se denomina «cultura da morte». «Lamentavelmente, disse o Papa com palavras duras, uma grande parte da sociedade atual se assemelha à que São Paulo descreve na carta aos Romanos; está formada de homens que aprisionam a verdade na injustiça (Rm 1, 18): havendo renegado a Deus e crendo poder construir a cidade terrena sem necessidade dEle, se ofuscaram em seus raciocínios de modo que seu insensato coração se entenebreceu..
Jactando-se de sábios se tronaram estúpidos, se fizeram autores de obras dignas de morte e não somente as praticam, senão que aprovam aos que a cometem. Quando a consciência – este luminoso olho da alma - chama ao mal bem e ao bem mal, caminha já para sua degradação mais inquietante e para a mais tenebrosa cegueira moral».
Em outro documento escreveu: «A perda do sentido do pecado é uma forma ou fruto da negação de Deus: não somente da atéia, senão ademais da secularista. Pecar não é somente negar a Deus; é também viver como se Ele não existisse, é apaga-Lo da própria existência diária.
Sem embargo, «não se pode eliminar completamente o sentido de Deus nem apagar a consciência, assim tampouco nunca se apaga completamente o sentido do pecado». Se não se pode apagar totalmente o sentido de Deus, então este se faz presente de outra maneira: o homem pode sentir-se órfão de um Deus que não percebe por seus pecados; ou bem olhará a Deus como o inimigo de sua consciência pecado,, ou seja, passa a ter um «sentido ameaçador» da Justiça divina.
2 comentários:
Existem duas formas de destruir a misericórdia: eliminando o pecado e eliminando o perdão. Estas são precisamente as duas atitudes mais comuns nos dias que correm. Numa enorme quantidade de situações não se vê nada de mal. Naquelas em que se vê, não há desculpa possível. As acções do próximo ou são indiferentes ou intoleráveis. O que nunca são é censuradas e perdoadas. O que nunca se faz é combinar o repúdio do pecado com a compaixão pelo pecador.
Deus é ao mesmo tempo misericórdia e justiça. Somente compreendendo sua misericórdia se compreende sua justiça, e compreendendo sua justiça se compreende sua misericórdia. A sociedade de hoje procurou exilar-se de Deus, e quando, de longe, olha para Ele, quer ver apenas uma parte, como vemos a lua: distante e parcialmente.
Deus porém é a totalidade e a integridade, não podemos buscar ver nEle apenas um aspecto. Seria, no ditado popular, tentar «tapar o sol com a peneira», uma vez que Deus é o Sol da justiça.
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