=== “Eis aqui o homem”.
Essas palavras de Pilatos atrai a atenção de quem lê atentamente a Paixão. São palavras muito sugestivas para os que crêem em Jesus e no valor de seu sacrifícios.
É um momento em que o Salvador leva uma coroa de espinhos e um manto de púrpura. Pilatos estava convencido da inocência de Jesus. Ele não encontrava culpa nAquele homem. Por isso ordena a flagelação para tentar acalmar o povo, porém ele tinha consciência clara que estava cometendo uma injustiça.
Depois da flagelação Pilatos, contemplando o próprio Filho de Deus no estado miserável que o deixou os golpes infligidos, o mostrou ao povo. Sua intenção não era de provocar um movimento de piedade, mas para dizer que um homem neste estado não tem nada de perigoso.
Pilatos então o apresenta e diz: «Eis o homem». Que encontramos por trás disto?
Em primeiro lugar, á um convite a olhar: Ecce
É um reclamo de um olhar que normalmente é mais para um espetáculo, para um acontecimento.
O que significa aqui o homem?
A intenção de Pilatos era afirmar: «Eis aqui este pobre homem, um impotente a quem ninguém pode temer, reduzido à condição mais deplorável».
Depois, quando a multidão responde de forma diferente do que ele esperava, Pilatos, sempre indeciso e nunca tomando a posição verdadeira e coerente com a verdade e com o seu dever de zelar pela ordem e defender a vida de Jesus, que ele tinha certeza de que era inocente, vai lançar outra expressão:
Jn 19, 14: “Eis aqui o vosso rei”. O que há detrás de tudo isso?
Ele vai usar este título de rei como uma provocação a aquele que obrigam a que Jesus vá ao suplício. Antes ele disse eis aqui o homem, agora o apresenta como rei.
Pilatos pergunta a Jesus o que é a verdade. Ele que era pagão, um romano que queria viver a vida de uma maneira fácil, sem sentido do transcendente, um relativista, por isso pergunta, que é a verdade? No fundo, juntado a pergunta pela verdade com o ecce homo, Pilatos nos põe a pergunta: Que vale o ser humano?
Qual pode ser o sentido do Ecce Homo no desígnio divino?
A ideia é clara. Umas palavras ditas por Pilatos podem ser objeto de uma revelação divina, como a famosa profecia de Caifás: “vale mais que morra um homem pelo povo”.
Os termos “eis o homem”, ainda sendo uma expressão perfeitamente natural, sem embargo, não somente tem um sentido dado por Pilatos. Poderíamos pensar que estas expressões são o cumprimento de um desígnio divino.
O significado superior de uma intenção divina é sublinhado pelo diálogo precedente de Jesus com Pilatos.
Pilatos pergunta: “És rei?”.
Jesus responde: “Tu o dizes, eu sou rei”.
Porém Jesus faz uma precisão: “meu reino não é deste mundo”.
Pilatos sabe que Jesus não é rei terreno, mas pergunta. Esta pergunta serve para que o Senhor faça uma revelação.
Pode-se presumir que aqui se apresenta um novo modelo de homem, na obra divina da salvação. O modelo é totalmente inesperado. O que vem proposto como o homem, não é o produto do êxito humano, mas é o homem humilhado, escarnecido, golpeado, não é o homem que alcançou desenvolver todas suas faculdades humanas.
É o homem reduzido a um estado miserável. No Antigo Testamento, o justo aparece como o exitoso. Homem bendito por Deus era sinônimo de êxito.
Aqui vemos ao mais inocente, colocado na desgraça. O bem que realizou não o livrou da prova.
Pilatos disse que não encontrava culpa em Jesus, mas apesar disso manda matá-lo. É o homem marcado pela injustiça, pela falta de êxito humano, é o homem que vai alcançar a vitória. Da injustiça, Jesus leva sinais em sua carne. As chagas da flagelação.
A multidão que havia recebido milagres não manifesta gratidão mas odeia a Jesus, o homem justo, que sofreu a injustiça de ser preso, flagelado, etc., mas que recebe ainda a ingratidão do povo a quem serviu.
Nestas cenas não há nenhum gesto de condescendência, de amor, nada. Tudo é humilhação, desprezo, injustiça sofrida pelo inocente. Jesus aparece desprovido de tudo aquilo que nós exigimos e reivindicamos como nossos direitos pessoais. Não há agradecimento, não há estima, há só injustiças.
Nos planos divinos, se percebe que o Criador tenha em seus desígnios que esta afirmação de Pilatos, eis aqui o homem, estaria revelando um novo modelo de humanidade.
A autoridade civil que podia dar leis, sem querer declara o sentido da nova humanidade, enquanto no processo religioso, as autoridades religiosas também atuaram num quadro de desígnio divino, por exemplo a frase de Caifás, que dava o sentido do sacrifício do Senhor. A teologia chama isto de profecia ex eventum.
Jn 11, 50-52: “Sendo sumo sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus ia morrer pela nação”.
Jesus reconhece logo uma pergunta que Caifás lhe faz: “te conjuro: Diz-nos se és filhos de Deus”
Jesus responde: “tu o dizes”.
O Sumo sacerdote faz uma pergunta que traz o problema fundamental. Jesus se apresenta como Filho de Deus.
- O processo religioso termina dizendo: Sou Deus!
- O processo civil termina dizendo: És homem, homem autêntico.
Assim fica claro a verdadeira Personalidade de Jesus: Verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, em uma só Pessoa divina, como afirmaria, muitos séculos depois o Concílio de Calcedônia.
Os adversários acusam Jesus ante Pilatos porque se quis declarar rei. “Se tu não o condenas não és amigo de Cesar”. Colocam como se Jesus fosse um rival perigoso ao governador. Esta manobra absurda, de alguma maneira estava guiada pelo poder de Deus revelador.
Jesus diz: “Meu reino não é deste mundo”.
Para estabelecer seu reino, Jesus vem instituir um novo gênero de sociedade. Uma sociedade que acolhe a Deus, que acolhe ao reino e destinada a desenvolver-se pela relação com a verdade.
Neste sentido há um novo tipo de sociedade, a sociedade da verdade. A esta sociedade corresponde um novo tipo de homem, o autêntico homem.
Eis aqui o homem, são palavras que se referem ao homem que não duvidou em dizer que era rei.
Pilatos simplesmente constatou exteriormente a situação humana de Jesus, mas sem querê-lo, ao dizer «eis o homem», mostrou a Jesus como modelo da humanidade.
Na humanidade de hoje há numerosas situações geradoras de desprezo e que atingem um valor surpreendente. Bastaria ver o aparente “fracasso humano” das vidas dos santos.
A revolução da santidade não vem dos grandes do mundo. São poucos os grandes do mundo que fazem algo pelo mundo. A verdadeira santidade não estar em procurar a realização pessoal e a vitória pelos bens terrenos, mas em pôr os olhos na eternidade e servir a Deus.
Não podemos esquecer, porém, que vivemos na terra e que é nossa vida terrena que definirá nossa eternidade. Assim, a busca da glória terrena é dar passos no vazio para alcançar o nada.
Por outro lado, lutar, esforçar-se, propagar a glória de Deus é dar passos verdadeiros para alcançar a glória eterna prometida por Aquele que é o único e verdadeira Criador e Senhor de todas as coisas.
Texto baseado em apontamentos de classe: Mons. Pedro Hidalgo Díaz, Cuestiones Actuales de Cristología, Facultad de Teología Pontificia y Civil de Lima – Perú.
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