quinta-feira, 25 de agosto de 2011

A freira gulosa


Por Alexandre de Hollanda Cavalcanti
Conta-se que num convento de clausura as virtuosas freiras viviam a Quaresma em tão grande austeridade que ao final do período penitencial já as irmãs estavam emagrecidas e com semblante abatido pelas duras penitências e jejuns.
Porém havia entre elas uma que gostava de «cuidar da vida dos outros» e, no canto matutino do Ofício, enquanto os olhares recolhidos das austeras consagradas dirigiam-se tão somente às páginas do texto e partitura do cântico sacro, a curiosa irmã alternava seu olhar perscrutante pelos rostos de todas as irmas e, de repente, fixou-se em uma: bem nutrida, rosada, cheia de saúde, em contraste com os rostos macerados das outras freiras.
Terminada a oração a superiora é procurada pela curiosa freira que denuncia: Madre, eu creio que a Irmã Sabina não está cumprindo a regra do jejum.
- Como é isso? Faz parte de nossas regras o jejum preparatório durante toda a Quaresma, não podemos permitir violações!
- Desculpe, Madre, mas viu como ela está rosada, bem nutrida?
- Deixe comigo. Eu mesma vou verificar isto.
À noite, a superiora foi pé ante pé à cozinha, e escondeu-se por detrás das escuras cortinas da janela. Não demorou muito e ouviu passos. Olhando para um lado e para o outro, dirigia-se a Irmã Sabina ao armário onde estavam guardadas as guloseimas para a solene ceia Pascal, depois de terminadas as penitências da Quaresma. Não percebendo a silenciosa presença da superiora, abriu o armário e começou a deliciar-se com os doces, queijos, linguiças e outras «preciosidades» que ali estavam guardadas.
Neste momento, a superiora, sem sair de seu esconderijo, procurando falar com uma voz grave e tenebrosa, ecoando entre as abóbadas góticas da cozinha conventual disse cavernosamente:
- Irmã Sabina! Estais violando as regras! Ah, ah, ah...
- Quem está aí? - Perguntou assustada a gulosa freira.
- Eu, que te tentei a violar as regras...
O coração da freira pulsava em disparado... Mas, quem és?
- O demônio! - Respondeu a cavernosa voz.
- Ufa! Pensei que fosse a superiora! - e continuou comendo desaforadamente.
Esta hilariante anedota é muito interessante para nos ressaltar uma realidade bem patente: Todos nós sabemos que o tempo inteiro estamos diante de Deus, mas muitas vezes respeitamos mais a presença de uma pessoa que a do próprio Criador.
Nós nunca estamos a sós. Deus está sempre presente e a Ele vamos dar conta até de nossas palavras ociosas. Todas as vezes em que nossa consciência nos indicar que algo não deve ser feito, lembremo-nos que se desobedecemos estamos fazendo-o diante de Deus e de toda a humanidade, pois no dia do Juízo final, todos conhecerão cada uma de nossas ações, boas ou más.
Conhecendo esta nossa terrível fraqueza, Cristo instituiu o Sacramento da Penitência ou Confissão, a fim de que, tendo que confessar diante de um homem concreto, isso nos ajuda a compreender o mal que cometemos e nos previne de cometer outras vezes. O sacerdote representa a Deus e é ao Criador que confessamos e de quem recebemos o perdão, mas a presença física e material do ministro do Sacramento é indispensável para que alcancemos o perdão.
Esta é mais uma razão pela qual a confissão deve ser freqüente: Para que tenhamos sempre presente na hora da tentação, que vamos ter que confessar este pecado, e nos lembrarmos que o cometemos diante do próprio Deus que nos criou.
«Deus toma profundamente a sério nossa falta de seriedade». (Plinio Corrêa de Oliveira)

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