quarta-feira, 7 de março de 2012

O Estranho


Enviado por Mónica Bosa
Poucos anos depois que havia nascido, meu pai conheceu a um estranho, recém-chegado a à nossa pequena população. Desde o princípio, meu pai ficou fascinado com este encantador personagem, e em seguida o convidou a que vivesse com nossa família.
O Estranho aceitou e desde então vive conosco. Enquanto eu crescia, nunca perguntei seu lugar em minha família~em minha mente jovem já tinha um lugar muito especial. Meus pais eram instrutores complementários: minha mãe me ensinou o que era bom e o que era mau e meu pai me ensinou a obedecer. Porém o Estranho era nosso narrador. Mantinha-nos fascinados por horas com aventuras, mistérios e comédias. Ele sempre tinha respostas para qualquer coisa que quiséramos saber de política, história ou ciência. Conhecia todo do passado, do presente e até podia prever o futuro. Levou minha família pela primeira vez a uma partida de futebol. Fazia-me rir e me fazia chorar. O Estranho nunca parava de falar, porém a meu pai isso não importava.
Às vezes minha mãe se levantava cedo e calada — enquanto que o resto da família estava pendente para escutar o que ele tinha a dizer —, ia-se à cozinha para ter paz e tranquilidade. (Hoje me pergunto se ela terá rezado alguma vez para que o Estranho se fosse).
Meu pai dirigiu nosso lar com certas convicções morais, porém o Estranho nunca se sentia obrigado a honrá-las. As blasfêmias, as más palavras, por exemplo, não eram permitidas em nossa casa... nem por parte de nós, nem de nossos amigos ou de qualquer um que nos visitasse. Sem embargo, nosso visitante de longo prazo, lograva sem problemas usar sua linguagem imprópria que às vezes queimava meus ouvidos e que fazia com que papai se retorcesse e mamãe se enrubescesse.
Meu pai nunca nos deu permissão para tomar álcool. Porém o Estranho nos animou a tentar e depois a faze-lo regularmente. Fez com que os cigarros parecessem inofensivos e que os charutos e cachimbos parecessem coisas de pessoas importantes e distintas. Falava livremente sobre assuntos de sexo dentro de nossa casa e na frente de nossos pais, avós irmãos e irmãs por menores que fossem. Seus comentários às vezes eram evidentes, outros sugestivos e sempre vergonhosos.
Agora sei que meus conceitos sobre estes temas foram influenciados fortemente durante minha adolescência pelo Estranho. Repetidas vezes o criticaram, mas nunca fez caso aos valores de meus pais e mesmo assim, permaneceu em nossa casa.
Passaram-se mais de cinquenta anos desde que o Estanho se mudou para viver em nossa família. Desde então mudou muito, já não é tão fascinante como era no princípio, mas mesmo assim, agora acompanha todo mundo até dentro do quarto, da cozinha, em várias partes da casa.
Não obstante, ele continua sentado em seu lugar, esperando se alguém queira escutar suas palavras ou dedicar seu tempo a fazer-lhe companhia.
Seu nome?



Nós o chamamos Televisor, na intimidade, gostava de ser chamado pelo apelido «TV».

Nota:
É salutar que este texto seja lido em conjunto em cada família.
OBS.: Agora o Estranho tem um amigo íntimo que se chama computador, «amigado» com uma pessoa que nunca teve boa reputação, uma tal de Internet. Eles têm dois filhos: Celular e BlackBerry...


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